segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Flores no túmulo.


Existem antigas histórias sobre o cemitério da cidade.
Relatos de fantasmas, uivos, sons de correntes e outras fantásticas histórias.
Mas nada se compara ao que eu vi naquela noite de 1 de novembro.
Eu trabalho como guarda noturno da prefeitura, vigiava o patio onde ficavam as máquinas do munícipio, mas acabei sendo transferido para o cemitério.
O guarda que trabalhava ali tinha falecido poucos dias atrás de um ataque cardíaco.
Eu fazia rondas todos os dias, olhando cada um dos caminhos que há no cemitério.
E todas as noites quando chegava próximo de uma antiga sepultura no extremo leste do cemitério, via uma luz acesa, e quando me aproximava esta desaparecia.
Vasculhei toda a área, olhei por sinais de pegadas. Não tinha medo de histórias com assombrações, isso era bobagem de filmes.
Mas conforme a cena ia se repetindo, dia após dia, comecei a reparar mais nos barulhos a noite e parei pouco a pouco de fazer a ronda.
Meus nervos estavam começando a sentir o abalo daquele ambiente agourento .
Um dia antes de ir ao trabalho tomei um pouco de cachaça. Não aguentava mais ficar com medo.
Naquela noite impelido por uma valentia insana fui até o velho sepulcro onde a luz acendia e comecei a xingar a morta.
Falei obscenidades terríveis, desafiei a luz. E no mesmo instante surgiu aos meus pés uma pequena flor e depois outra até estar completamente coberto por flores brancas e esporoantes.
Logo um vento forte se abateu ali e eu respirei um pólem alúcinogeno que fez minha mente se expandir.
Eu vi os espiritos dos mortos, vi suas sombras, vi a morte e o demônio.
E vi no túmulo em que me sentara uma garota, vestida de branco, brilhando e rindo, fazendo o sinal da cruz ao olhar para algo atrás de mim.
Foi então que eu vi a figura alta de um homem corpulento, vestia se da noite, carregava uma foice, era a morte!!

Relato retirado dos diários do doutor Abdul Alhazred

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Uma descoberta inesperada.




O livro escrito pelo árabe louco, cujas lendas superam em muito o limite da imaginação humana. O necronomicon traz fórmulas e antigos segredos dimensionais que enlouquecem só de pensar.
Sua história é demoníaca e não sei de muitos detalhes, além do que já foi publicado.
Meu nome é Antônio Bueno da Silva. Trabalho como arquivista na biblioteca imperial na cidade do Rio de Janeiro.
Encontrei uma passagem secreta, que abria para um antigo lance de degraus que terminava em uma série de prateleiras baixas e muito mofadas.
Repleto de tomos, pergaminhos e manuscritos muito antigos, aquele local foi descoberto por acaso enquanto analisava as paredes a procura de uma infiltração que há muito tempo não fora consertada pelo governo carioca.
Eu estava só no momento, era novato e tinha ido trabalhar, mesmo enquanto os outros funcionários tinham entrado em greve.
Caminhei por aquela sala baixa, quando esbarrei num corpo num dos cantos, próximo a um diário, que parecia ser o alimento de traças e mofo há algumas centenas de anos.
Peguei as finas folhas com cuidado, e levei o para cima, e pouco a pouco movi os demais livros encontrados ali para a sala da restauração, misturados há várias obras antigas que estavam ali paradas por falta de materiais para serem recuperadas não seriam percebidas.
Limpei uma mesa e comecei o processo de restaurar o pergaminho que encontrará. Gastei nisso sete longas horas, mas quando a noite já estava caindo eu consegui ler.
Descrevi a história de um sábio que fora feito cativo e levado a Portugal pouco antes de D. Sebastião morrer na África, um homem culto conhecedor de mistérios antigos que viajará o mundo e vinha apavorando a colônia portuguesa nas Índias.
Procurei pelo nome e vi num pedaço quase borrado pelos produtos que usará para tirar o mofo um nome: Ali Alzahed.
Anotei o nome, iria pesquisar mais sobre ele na internet, quando chegasse em casa, pois a rede do prédio tinha sido cortada por falta de pagamento.
O relato prossguia falando que Dom Sebastião se interessou pelos seus conhecimentos e em pouco tempo administrava a biblioteca imperial.
Foi então onde passou a trazer livros interditos de vários lugares do mundo e passou a copia – los.
Relata, o que parece serem esboços de um culto entre os bibliotecários e copistas do rei organizado por ele. Uma ordem esotérica tão secreta cujos relatos nunca tinha ouvido falar.
Eles juraram proteger o conhecimento antigo e profundo, dos deuses há muito esquecidos daqueles não iniciados.
Espalharam cópias em pontos por toda Portugal. Mas veio então a derrocada de Ali, sua aparência não mudará nada em mais de cinquenta anos que servia a família imperial e com a morte do rei nas campanhas da África, as intrigas da corte o forçaram a sumir.
Se tornou um próscrito e foram enviadas cartas a todas as províncias e capitanias para que fosse morto caso encontrado.
No entanto ele não sairá de Portugal, passando a viver numa torre em Coimbra.
Há um hiato de tempo em que não tenho como provar, precisaria ter dinheiro para bancar mais pesquisas em fontes portuguesas.
Volto a ter relatos legíveis dele no início da guerra contra a França.
_ Provavelmente é um filho, ou herdeiro do nome, algo comum entre esótericos, pensei eu.
Mas ao passar uma lupa no texto notei com espanto e pavor que a caligrafia era a mesma. Idêntica a tal ponto que somente uma única pessoa redigira aqueles pápeis.
Fala de como conseguiu organizar no meio da fuga real, o envio dos livros.
E os contratempos ocorridos quando os navios partiram sem levar as obras.
Conta detalhes sobre correspondências com pessoas no mundo inteiro e de como todos pareciam interessados pela recente descoberta de Ali: Um manuscrito roubado da biblioteca proibida do Vaticano dois anos antes, por um ladrão que fora junto com o diplomata português para a corte do papa.
O necronomicon, o livro narra fórmulas escritas para fins além da compreensão. Mas sua descrição estava nos trechos finais da mensagem, em uma linguagem codificada tão incrivel que não consegui ler.
Não há mais páginas e eu não contei a ninguém sobre o caso. Tenho comigo em meu apartamento todos os livros achados naquela antiga sala.
Iriam ser jogados fora pelos técnicos do laboratório. Para eles não era nada além de velharia. Peguei todos e levei os comigo em segredo.
Desde então passo boa parte dos dias restaurando artesanalmente os compêndios e tenho ficado assustado.
São fórmulas de magias proibidas. Relatos místicos tão absurdos quanto estupendos, diários antigos que dão a localização de itens que antes apenas pertenciam a lendas.
Ontem aconteceu algo inesperado. Sonhei com sombras me perseguindo e eu me sufocando.
Vi pessoas dançando em uma praia suja, corpos de diferentes etnias nus e grotescamente pintados em uma orgia ritual tão insana que não me atrevo a descrever.
E eu estava ali no meio daquilo, meu corpo preso em um tronco ardia como sacríficio há uma divindade muito mais antiga que o tempo.
Pretendo fugir. Enviarei esse relato há meus amigos.
Aviso do servidor de e-mail: Trecho do e-mail corrompido. Ative seu antivírus antes de enviar ou receber mensagens.
***********************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************

Desaparecerei. A ignorância é uma benção, nunca busquem a verdade! E sempre deixem os acasos fechados!

Amor e loucura.



Desde que eu te conheci amei as flores porque lembravam você.
Gostava do sol e da alegria do mundo desperto.
Hoje só tenho paz em oníricas viagens, quando por um relance você reaparece.
Sua feição bela e alva como na primeira vez que eu te vi.
Quando você morreu, perdi o sentido da vida, decaí ao ocultismo, as drogas e
choro cada noite quando acordo.
 Surto em viagens loucas a procura da fórmula para te trazer de volta.
Por que por um mero instante eu consegui.
Roubei do museu de Paris, o tomo antigo e interdito escrito pelo árabe louco Abdul Alhazred, que segundo os antigos relatos podia trazer os mortos de volta a vida.
Fiz tudo que estava ali, levei semanas montando o ritual.
Sei que pareço um degenerado ao falar dessa forma e que muitos não entenderiam, mas eu fiz por amor.
Matei cinquenta pessoas e vinte cabeças de gado para conseguir o sal que traria ela de volta.
Sabia que a polícia iria vir atrás de mim. Que a morte dos mendigos e loucos não passaria despercebida, mas não me importava. Quanto mais eu folheava o livro, mais frenético ficava.
Até que veio a noite final, tudo deu errado. Ela apareceu para mim apenas por um momento.
Comprei um corpo de uma criança morta recentem de um perito corrupto da  polícia cientifica.
Algo deu errado,  não coube a alma dela, que se dissolveu deixando para trás um maldito cheiro pestilento.
O livro não deixava claro como deveria ser o corpo. A página estava rasgada, creio que por outro ocultista
Foi então que a polícia chegou e me prenderam. Provavelmente o livro está desaparecido, mesmo louco por meu objetivo eu percebi que haviam pessoas me seguindo.
Pessoas de várias partes do mundo, homens e mulheres que desapareciam quando eu os olhava fixamente.
A minha pena já está dada. Morri no dia que eu a vi perecer novamente.
Não haverá tribunal nem sentença. Apenas esse depoimento de um coração despedaçado pelo amor que dilacerou minha mente e deixou para trás apenas culpa e dor.
Depoimento prestado por Charles Ward horas antes de se matar com um cadarço em sua cela na delegacia central.

sábado, 21 de janeiro de 2017

A assombração.



Caminhar pelo centro da Cidade de Goiás a noite é um convite ao pesadelo.
As ruas mau iluminadas pela bruxuleante luz de antigos postes e as fachadas imponentes das catedrais causam sensações aterrorizantes em mentes sensíveis.
Eu tinha saído do hotel as cinco da tarde para uma reunião na casa de um deputado. Iriamos criar uma nova droga financiada pelo governo e a comissão que aquele senhor presidia exigia dez por cento do contrato para aprovar.
Consegui negociar e reduzi a margem da propina para cinco por cento e o restante em lucro direto pela venda da patente para o sistema público de saúde.
Era uma droga contra a nova febre que tinha se alastrado pelo nordeste e já vinha matando milhares de pessoas todos os anos.
Sai dali tarde da noite, me ofereceram carona, mas por algum motivo eu os temi e decidi ir a pé.
Eram poucas quadras que me separavam do hotel.
Do alto das sacadas com cerâmicas portuguesas, plantas exuberantes pareciam brilhar ao meu redor.
Quando passei próximo a uma casa de paredes caiadas, com gárgulas na porta, aconteceu algo inesperado.
Um dos animais de pedra chamou meu nome:
João, João! Um som profundo e desencarnado me paralisou e levou meus olhos até os dois demônios de pedra.
No mesmo instante uma das criaturas se levantou e começou a recitar um poema.
_ Meu senhor morreu de peste.
_ Minha senhora de malária.
_ O filho de tristeza.
_ A filha fugiu para Cantuária.
_ Somos guardiões de uma mansão esquecida.
_ Olhamos pelos mortais e sua vida ensandecida.
_ Somos guardiões, de horríveis feições, mas pelo bem combatemos.
_ Tua alma está suja, hoje pelo Deus que há nos céus, iremos lhe limpar!
E quando terminou essa frase tocou na outra peça de mármore que adquiriu vida.
Ao ver aquilo as minhas pernas saíram da paralisia e mesmo tendo defecado em minhas calças pelo medo, sai berrando a plenos pulmões.
Percebia as luzes se acendendo enquanto eu corria até a exaustão.
Cai exausto próximo ao rio vermelho, fora dos limites da cidade.
As árvores emitiam um leve farfalhar com suas folhas e somente a lua nos céus permitia me discernir o caminho por mim percorrido.
Minhas roupas estavam fétidas, fezes escorriam pelas pernas. Eu estava mais calmo, respirava profundamente e percebi que tudo deveria ter sido um delírio, uma histeria frenética, causada pela aparência sinistra da cidade a noite.
Caminhei em direção a água para tentar me limpar um pouco e voltar pela trilha, toquei a água do Rio e no mesmo instante senti uma pancada nas costas que me empurrou para as águas.
Fiquei desacordado por alguns segundos e acordei assustado enquanto lutava para voltar a superfície.
Gritei pedindo socorro, estava sem forças, até que uma patrulha da polícia ouviu meus gritos e tirou me quase inerte da água.
Quando recuperei a consciência no hospital, decidi que iria me limpar. Não queria ser perseguido por aquelas horrendas aberrações.
Contei tudo para o senhor delegado, tanto da minha experiência sobrenatural, quanto dos esquemas de corrupção que envolvem a assembleia estadual e o governador.
Peço somente que eu fique preso aqui para escapar daquelas malditas criaturas.

Esse foi o depoimento do homem, os documentos dele nos mostraram que era o chefe do departamento de ciência médica da universidade estadual, no seu celular encontramos as provas necessárias para levar a condenação das autoridades.
No entanto é preso informar a autoridade judicial que a testemunha acabou cometendo suicídio.
Os peritos analisaram a cena e constataram que ele praticou tal ato em um surto histérico.
Outros detentos no mesmo pavilhão disseram que ele gritava frases sem sentido, pedindo para que algo se afastasse.
No demais está em anexo todos os laudos e depoimentos feitos durante a investigação.

Dr. Marcos Almir Fernandes.
Delegado chefe da cidade de Goiás.



Corpos carbonizados

Muitos anos trabalhando no instituto médico legal não me prepararam para aquela cena e nem para o que viria depois.
Fui chamada para uma cena de crime, um assassinato, chegando ao local percebi que poucas evidências se manteriam por muito tempo ali.
Era um arcada em forma de u, escura, de aparência pestilenta do alto escorria um líquido marrom que seguia por uma canaleta até cair no esgoto central.
O policial que guarnecia o local me levou até o cadáver, enquanto caminhava pude ouvir pequenos guinchados de ratos, enquanto atravessamos aquele espaço, manchado de bolor que rescindia uma aroma horrendo.
Em toda Paris locais como aquele eram comuns, e eu torcia para que o novo prefeito conseguisse destruir todas aquelas velharias imundas.
Chegamos a uma casa de pedras antigas, parecia ser um antigo palacete, mas hoje servia como uma pensão pouco respeitável no extremo norte da cidade.
O corpo era de uma mulher, tinha um dos lados da face queimado horrivelmente. O crime tinha acontecido a pouco tempo, pois ao chegar próximo da morta, ainda era possível sentir o cheiro de carne queimada.
Sua roupa estava em trapos e somente alguns pedaços de pano, ainda inteiros, tampavam seu corpo.
Os braços tinham cicatrizes e as pontas dos dedos estavam carbonizadas, pondo a mostra os ossos dos dedos.
Os dentes estavam em pedaços, marcas no lado da face não tinha sido torrada mostravam sinais de um brutal espancamento que no outro lado estavam escondidos pela carne incinerada.
Enquanto analisava, tirava fotos, procurava documentos, sentia uma repulsa por aquele cadáver tão grande. Que piorou quando eu a vi no laboratório.
As entranhas tinham sido incineradas. Era como se ela houvesse sido incendiada de dentro para fora.
O caso tomou os jornais e dois dias depois alguns amigos reconheceram a jovem que era notícia como sendo uma brasileira de nome: Marina, que vivia numa pensão em Rouen, há vários quilômetros de Paris.
Não faziam ideia do que havia acontecido para levar a jovem a um fim tão cruel.
Por sorte ela era descuidada e deixou o celular no pequeno apartamento onde residia mais duas colegas.
Pesquisei no registro de chamadas do aparelho. Encontrei o último número, mas algo estranho ocorreu quando mandei o computador procurar o registro daquele telefone.
A máquina simplesmente pifou. Num súbito desligamento que me assustou bastante. Cai para trás e só alguns minutos depois me recompus.
Avisei meu chefe sobre o que tinha acontecido e ele receoso de ataques terroristas ou de hackers, acionou o serviço de defesa.
Passei horas escrevendo relatórios, dando depoimentos e fui proibida de deixar Paris.
Me deram duas semanas de suspensão e eu sabia que nesse meio tempo estaria sendo vigiada a todo momento pelo serviço secreto.
Na primeira noite foi quando começou, um mensagem no celular de um número anônimo me mandava esquecer aquele caso.
Fiquei apavorada e peguei um táxi até a delegacia mais próxima. Contatei um detetive que estava de plantão e este me prometeu investigar o caso.
Quando voltei para casa, a porta estava aberta e em cima da minha cama tinha um punhal e numa das paredes escrito com uma tinta negra os dizeres: Desista!
Eu gritei histericamente e isso alertou os vizinhos que vieram a mim e logo chamaram a polícia.
Em minutos minha casa estava cheia de peritos, de policiais e agentes do serviço secreto.
Fui colocada no serviço de proteção as testemunhas e por quase dois meses tive um pouco de sossego.
Passava os dias trancada em casa, lendo muito até que por fim resolvi escrever essas notas em um notebook velho, deixado pelos agentes num canto, junto a outros materiais eletrônicos antigos.
No décimo quarto dia de julho, os agentes que protegiam minha casa saíram mais cedo. Era feriado e eu sabia que só estaria protegida novamente a noite.
Todos iam a festas e eu iria ficar ali, prisioneira de um assassino que conseguiu despistar os esforços de todas as forças de segurança da França.
Pela televisão acompanhei a aparição de vários outros casos estranhos por todo o país. Alguns sensacionalistas já começavam a criar a narrativa de um culto a demônios e os associava aos imigrantes, em especial aos africanos, impulsionando o renascimento da xenofobia.
O governo já estava usando até o exército naquela série de casos, as eleições se aproximavam e todos os lados envolvidos usavam dos ocorridos como propaganda de campanha.
Naquela noite dormi cedo e acordei com um punhal cravado a poucos centímetros da minha vagina. Na janela a luz da lua brilhava a palavra: Saudade!
Entrei em pânico e sai correndo porta afora, gritando como louca, fui levada a um hospital e de lá a outra casa de segurança, dessa vez dentro de uma base.
Peguei o notebook da antiga casa. Assim que isso acabasse eu publicaria essas histórias.
Relato retirado de um computador usado pela agente Marie Le Miscret, o comboio que a levaria para fora de Paris foi completamente destruído por uma bomba plantada embaixo da rua e acionada no exato momento que passaram por ali.
A mochila foi lançada alguns metros para o lado e ficou intacta próximo ao meio fio.
Os corpos não puderam ser identificados, incinerados e despedaçados de tal modo que pareciam apenas uma massa de carne em meio ao metal retorcido.

Howard Philips – Perito chefe da área de informática.
Sessão 4 – Departamento de assuntos secretos.


O diário de Carlos Alquevarado.



Semanas atrás recebi uma carta do meu avô, um antiquário, que vendia e comprava arte em todo Brasil e hoje fiquei sabendo da sua morte, na catacumba da velha igreja de Nossa senhora do Rosário, na cidade de Goiás.
Transcrevo a nesse e-mail para o senhor delegado, com o interesse de ajudar lhe nas investigações.
Não irei pessoalmente ao Brasil, pois pretendo cumprir a vontade dele e por temer que o assassino ainda esteja a solta.
Marina Augusto Silva


Na cidade de Cruz da Fortaleza existem poucos lugares onde se pode conseguir livros, um deles é o velho antiquário do senhor Alquevarado, um homem velho, de aparência austera e arrogante.
Minha avó me contou que aquela família tinha chegado a cidade anos atrás, sempre encerrada em mistérios imemoriais.
Os mais supersticiosos diziam serem eles feiticeiros, que tinham fugido da Espanha para escapar da inquisição.
Mas eu não acreditava nisso, pensava serem bobagens de velhos, quando vi uma placa na porta do antiquário dizendo que precisavam de ajudante, aceitei a vaga.
Era o final dos anos 80 e eu tinha 15 anos, minha família passava dificuldades e eu resolvi aceitar aquele emprego.
Trabalhava com afinco, recebendo 100 reais por mês e pouco a pouco fui ficando amigo da filha do meu patrão, uma criança de 5 anos chamada Maria.
Ela gostava de histórias e como eu passava quase o dia todo lendo devido a ausência de clientes, contava lhe as narrativas das mil e uma noites.
Gostava de vê – la narrar as histórias para o pai, quando este lhe pegava no colo. O homem parecia ficar feliz com isso e muitas vezes me dava notas menores como gratificação pelas histórias que eu contava.
Minha memória fraqueja pela idade e não me lembro o nome dele. Muitos episódios menores ocorreram durante o tempo que estive empregado ali, caixas que sumiam, livros antigos que chegavam todo dia 6 de cada mês.
Eu lia alguns desses, mas não entendia nada, eram todos em idiomas esquecidos, com símbolos, desenhos e fórmulas bem antigos. Até tentei pesquisar sobre alguns daqueles desenhos em enciclopédias na biblioteca da cidade, mas nenhuma delas tinha nada a respeito.
Até o dia em que eu fui ordenado a limpar a loja, tirando a poeira de tudo e depois eu estaria liberado. Estranhei aquilo, mas não discuti, comecei a limpeza dos itens da pequena loja pela manhã e na hora do almoço já estava tudo terminado.
Bati na porta do escritório do senhor Alquevarado, ele abriu e com olhar assustado me entregou um pequeno livro como presente.
Não sabia que aquela seria a última vez que eu o veria.
A noite, um guarda encontrou a porta da loja acesa durante a ronda, entrou e encontrou os corpos do homem e da filha carbonizados.
A esposa, que vivia reclusa dada a tuberculose morreu pelo choque da notícia. E por mais incrível que apareça eu ganhei a loja e um legado que até hoje me assombra a noite.
A lenda do local se adensou e até hoje tem pessoas que não entram na pequena porta próxima a velha catedral.
Eu enterrei o velho livro junto ao corpo de meu antigo patrão. Fiz isso depois de ler que ele e seus antepassados tinham trazido a terra uma antiga e repulsiva criatura, numa mansão velha na cidade de Pirenopólis, um antigo demônio noturno, e de como tinham se tornado lacaios dessa criatura, fornecendo lhe tomos antigos, comprados de mercadores amedrontados, para que o horrendo ser estudasse artes místicas.
As lendas eram verdadeiras, temo só de imaginar que horrores tenebrosos habitam essa maldita casa no fim de uma rua pouco movimentada. Uma construção de pedra reforçada que ainda hoje existe e que por direito me pertence, mas eu jamais pisarei ali dentro, os horrores descritos no velho livro me atemorizam até hoje.
Escrevo essas memórias para avisar a você, Marina, a herança que eu herdei é sua, e por isso não quero vê – la em perigo quando eu partir.
Você foi para a Europa com uma bolsa de estudos estudar arte, fique por ai! Jamais retorne ao Brasil, nunca pise novamente nesse país!
Posso estar louco, mas há poucos dias recebi uma carta, escrita numa tinta pegajosa, de um vermelho vivo quase aberrante.
Os dizeres da carta me avisavam que Nephesh tinha se libertado e que eu teria de cumprir meu trato e dar lhe mais livros ou morrer.
Não sei o que fazer, pretendo fugir dessa horrível criatura, ela não vai me matar, ela não vai me matar!
Adeus, e não venha nem mesmo ao meu funeral! Te amo demais para te ver morrer.

Augusto Silva Campos”

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Sangue



A casa no fim da rua sempre esteve fechada. Desde que mudei para essa cidade nunca soube de moradores naquela antiga mansão.
Era uma casa em estilo colonial, feita de pedra maciça que estava em ruínas.
Ouvia os garotos mais velhos contarem histórias terríveis sobre aquela mansão. Falavam de uivos, fantasmas e desaparecimentos. Mas eu sabia que eles gostavam de mentir para assustar.
Minha mente sempre foi curiosa e nunca fui de ter medo. E logo vim a me interessar pela antiga construção.
Fui a biblioteca da cidade e comecei a perguntar aos velhos que eu conhecia sobre a real história que havia ocorrido ali.
Mas ao invés de me contar a verdade, se evadiam com meias palavras e mudavam de assunto.
Aquila ausência de fatos, era como um convite para eu saber mais. Certo dia não voltei para a casa depois da escola.
Resolvido a descobrir o mistério, pulei o velho muro, o jardim era seco, e por todo lado via se pedaços da construção que parecia estar prestes a desmoronar.
Dei a volta na casa, fotografando cada detalhe do exterior, na esperança de saber mais sobre ao pesquisar na internet.
Pus meu celular no bolso e abri a porta. Era uma antiga porta de carvalho reforçada com uma espécie de brasão entalhado na maçaneta e nos umbrais.
Na hora que abri senti um forte cheiro de mofo e um outro odor que não sei precisar, fugi dali e alguns passos depois fiquei paralisado de puro horror, estava próximo ao muro e dali podia ver as janelas da casa, e quando olhei para uma delas no lado esquerdo da casa, senti algo me olhando.
Fiquei paralisado e devo ter caído desmaiado e só me recordo de acordar completamente cego.
Apalpei o chão e sentir a poça de sangue que tinha formado ao meu redor. E ouvir uma risada e alguém gritar as seguintes palavras: “Nephesh Adah Kelin.”
Os policiais foram acionados por algum vizinho ao ouvir meus gritos. Não sei de mais nada, não lembro de mais nada. Minha mente volta novamente para aquela cena macabra todas as noites e me recordo da voz em minha mente.
Depoimento do garoto Mateus Silva, durante suas sessões.
Doutor Abdul Alhazred

Anexado ao inquérito policial



quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

A placa.


Na estrada que liga Santo Antônio a Brasília tem uma curva e na beira do caminho uma antiga placa, com letras desbotadas, repleta de mofo e ferrugem.
Poucos motoristas das cidades ao redor tem coragem para sequer parar ali e verificar os dizeres daquele objeto, pois remetem a uma história que querem apagar.
Os mais jovens em sua impetuosidade e desrespeito pela tradição do local, não se importam com essas histórias, que consideram meras crendices bobas.
Um destes para mostrar sua coragem decide ir até a placa, urinar nela e depois grafitar um pênis.
Foram ele e mais alguns amigos, gravaram a cena de depredação do patrimônio público, quando um deles notou ao longe um brilho surgindo a distância, uma luz vaporosa, em tons esverdeados tóxicos.
Os rapazes mais corajosos correram em direção a nuvens enquanto os mais covardes voltavam para a cidade gritando a plenos pulmões.
E eu que estava com a câmera fiquei ali, parado, com as pernas paralisadas, tremendo de puro horror. Urina descia pelas minhas pernas, ao olhar para aquela nuvem de fumaça que parecia se adensar conforme os segundos se passavam, tive a certeza que iria morrer.
Meu coração parecia querer sair do peito. Minhas mãos suavam frio e poucos segundos antes da nuvem vir em minha direção, eu desmaiei e não lembro de mais nada.
A primeira cena que registrei quando acordei foram os ossos dos meus amigos próximos a placa, reconheci os rapazes que tinham sido corajosos e foram em direção ao desconhecido.
A placa estava coberta de sangue e pedaços de carne, como se o ar tóxico tivesse vomitado as entranhas de meus amigos ali para aumentar o aviso do perigo que estava naquele local.
Um senhor me encontrou em pânico, estava sentado em estado de puro choque. Ao meu lado estava a câmera.
Fui levado ao hospital, e depois de algumas horas, quando recuperei a consciência um policial apareceu para colher meu depoimento acerca do ocorrido.
Quando eu entreguei a fita da câmera, o caso criou contornos ainda mais assustadores, pois no meio daquela tempestade tóxica, era possível visualizar usando o recurso do zoom, a figura de um pequeno rapaz, com um barrete vermelho que vinha cavalgando uma espécie de nuvem na direção dos meus amigos que iam em sua direção.
Fui obrigado a ver no meu segundo depoimento a cena hedionda da morte deles, suas cabeças foram mastigadas por aquela massa gasosa que cuspiu os ossos dos crânios ao longe.
A cena terminava segundos depois comigo caindo desmaiado, o áudio no entanto era tão aterrador, que implorei para pararem imediatamente.
Nas semanas que passaram, repórteres do mundo inteiro tiveram contato com o caso e em vários sites da internet, o meu vídeo era exposto, o que me fez ficar afastado da rede.
Me isolei na casa de um tio, no Mato Grosso, um local afastado onde o acesso era muito difícil.
Foi quando recebi uma ligação de minha mãe, contando que todos os rapazes que tinham sobrevivido estavam morrendo de maneira súbita e brutal, narrou que todos estavam atemorizados e muitos começavam a me culpar pelo fato, chegando até a ameaça – la diretamente.
Senti um frio na coluna e disse para ela não se preocupar que tudo iria acabar bem.
Como eu estava errado, depois de dois dias, meu tio chegou correndo em casa.
Suas feições estavam lívidas, ele dizia que todos na região estavam loucos e falavam de um fantasma verde que procurava um forasteiro e quando não tinha a resposta esperada, devorava os sem pensar, tomando o corpo e deixando somente um punhado de ossos corroídos como ácido.
Quando ele terminou de me dizer isso, eu vi ao longe a forma horripilante vindo devagar, corri para o porão na esperança de me esconder e quando narro essas palavras em um velho computador, ouço meu tio dar seus últimos gemidos.
Adeus mãe, eu te amo.


terça-feira, 17 de janeiro de 2017

A caverna

Marcos era um detetive da pequena cidade de Cruz da Fortaleza, o ano é 1929, a crise faz o governo Vargas queimar sacas de café, por todo o lado a pobreza se espalha.
Em uma antiga mina desativada, próximo a divisa com a cidade de Goiás, foi encontrado um corpo, uma jovem assassinada no meio da caverna foi achada por um agricultor que ao passear de cavalo pela região estranhou urubus voando ao redor da entrada da caverna.
O local parecia com um templo pagão, imagens esculpidas em barro e bronze se espalhavam por todos os lados.
Um caderno com anotações foi encontrado ao lado do corpo, um homem que assinava apenas com a letra H começava dizendo que tinha descoberto uma antiga cidade no norte, em meio a floresta Amazônica.
Ele entrou em um templo junto com uma equipe de amigos para filmar o novo local, eram estudantes e pensaram que ganhariam muito dinheiro.
Algumas páginas para frente ele diz que quando entraram no local uma sombra tomou conta de seus amigos que começaram a agir como animais.
Ele entrou correndo no local, com medo daquilo e avançando com cuidado chegou até o centro do templo, onde num altar repleto de teias de aranha ele encontrou uma pequena figura feita de bronze.
A imagem era perturbadora, parecia ser humana mas não tinha rosto, apenas uma forma brilhante e esverdeada.
Seu corpo pareceu ir sozinho rumo a estátua e quando ele a tocou sentiu se angustiado, pensou em se matar ali naquele momento, mas logo foi tomado por uma fúria assassina e correu até a porta, onde seus amigos estavam e os matou, enquanto eles ainda agiam animalescamente.
Depois disso ficou desacordado por horas, não se lembrava de nada, quando levantou no entanto estava com as roupas sujas de sangue e corpos abertos ao seu redor tinham as vísceras a mostra, vermes apareciam pelos buracos.
Sua mente estava confusa e uma ânsia de vômito fortíssima invadiu o, forçando o a se agachar em meio a podridão que saiu de seu estômago pode ver pedaços de carne perdidos em meio ao suco gástrico apodrecido.
Só então ele percebeu que tinha tirado a vida daqueles corpos, dos seus amigos. Se sentiu sujo, imundo, correu em meio a floresta, gritando, sem saber que carregava a estátua dentro da mochila.
Caiu exausto e por sorte foi encontrado por um grupo de ribeirinhos que pescavam próximo aquele local e ouviram no.
Acordou depois de algum tempo num barco sozinho no meio do Rio Solimões, ao longe ele viu homens brigando com facões e jogado na margem a estátua.
Na mesma hora saiu em disparada do barco e como louco nadou até a margem, pegou a estátua e correu pela mata. Os homens na beira do rio ainda brigavam, o som dos facões foi se afastando até o ponto de sumir.
Quando percebeu que estava a salvo com sua posse sua mente desanuviou se e ele sentiu fome.
Por sorte tinha chegado próximo a um acampamento indígena. As mulheres ao vê – lo chegar saíram correndo, os homens da tribo tinham saído para caçar e quando chegaram o encontraram comendo e bebendo água tranquilamente.
Foram para o atacar, mas no mesmo instante viram o objeto e caíram ajoelhado diante dele.
O pajé da tribo ficou lívido e pediu que lhe entregasse aquilo para que ele devolvesse ao lugar de onde não deveria ser tirado. Falava em português com sotaque e quando terminou de falar, os olhos da estátua brilharam e o homem começou a gritar que estava em chamas.
A história do caderno de anotações parou e só foi retomada quase no fim.
O misterioso H dizia que depois de fugir da tribo, ele chegou a Goiás, o objeto místico tinha sido furtado e ele iria recorrer a uma magia profana para encontrar seu mais valioso bem.
O relato continua com ele descrevendo que não tem muitos momentos de lucidez, sua mente parece estar se expandindo rápido demais e ele começa a passar várias horas do dia ouvindo vozes que não parecem ser humanas, vindas de outras dimensões e que sentia se perseguido a noite, não conseguindo dormir.
A história do caderno termina com ele narrando como enganou uma jovem moradora da fazenda Rio Azul a segui – lo e como ele a enganou e prendeu, enquanto preparava o ritual.
Termina com apenas uma descrição, eu sei onde ele está, preciso chegar logo!

2

Anos se passaram e nada mais se soube dessa estátua nem do cultista responsável por essa morte.
Os ribeirinhos da região evitavam até mesmo passar próximo ao local do antigo templo e a história se tornou uma lenda para assustar crianças travessas.
Setenta anos depois um explorador espanhol, Ramon Alzareda, ao coletar informações da região para um livro acabou ouvindo a história do templo e dos fatos ocorridos na época e se interessou.
Ninguém no entanto quis leva – lo até o local, precisou desembolsar uma grande quantia para convencer um dos pescadores a guia – lo até o templo perdido em meio a floresta e mesmo assim este não quis passar a noite ali.
Ficou combinado que iria voltar dentro de dois dias para busca – lo.
O pesquisador foi deixado num igarapé próximo, já era tarde e com dificuldade chegou até a entrada do local, ali encontrou vários ossos humanos e de animais que formavam um pavoroso cenário.
O cheiro de podridão que saía da entrada era tremendo, ao tocar na parede da entrada notou que ela estava repleta de vermes que passeavam pela pedra repleta de limo.
Montou acampamento na entrada da caverna, comeu uma pequena refeição e se banhou nas águas, tomando cuidado para não ser atacado por animais ferozes.
Só então se preocupou em entrar no local, riu um pouco das lendas que os ribeirinhos contavam, pegou um pequeno diário de anotações e as escreveu, iria usa – las para ilustrar um artigo sobre a ignorãncia dos povos ribeirinhos.
A noite ele foi em direção da caverna, tirou da mochila um lampião e iluminou uma inscrição que estava na entrada, tinha estudado na universidade de Salamanca sobre idiomas antigos conseguia reconhecer alguns dos símbolos ali retratados.
Era uma linguagem arcaica que lembrava um pouco o idioma dos sumérios, parecia com um aviso. Não entre nesse templo, pois aqui habita Aztoth, o mal que devastou Atlântida.
Ramon riu daquilo, pegou um pequeno diário e desenhou os escritos. Iria envia – los para seus professores de arqueologia.
Avançou pelo antigo templo, parando para ler as inscrições nas paredes, relatos antigos feitos em tinta, eram avisos sobre a criatura que ali habitava, seus feitos e a loucura que ela causava.
Ele tocava as inscrições, raspando o mofo e tirando os vermes que se acumulavam nas paredes, até que quando raspou um pouco da pedra para tirar uma amostra para enviar a um laboratório, o fragmento que pegou se transformou em sangue e escorreu por suas mãos rapidamente caindo no chão e no mesmo instante o local começou a esfriar,
Começou a ter uma vertigem e piscou os olhos e por um momento ele sentiu se entrando no estômago de uma grande fera.
Mas logo a sensação passou, no entanto sentiu que o ar tinha esfriado e a medida que dava passos seu corpo parecia esfriar mais ainda.
A luz começou a oscilar, ele tirou pilhas do bolso e colocou as no aparelho, mas não adiantou.
Começou a ter dificuldades para ler as inscrições, os avisos foram ficando mais sérios, avisando que ali dentro estava algo que enlouquecia os homens.
No momento que leu essas últimas inscrições, pisou em falso na escada e liberou um alçapão que o fez cair por vários metros.
Seu caderno escapou de suas mãos, caindo no chão de pedra, próximo a saída. Ramon caiu alguns andares abaixo, em um baque surdo, o lampião desceu e ficou poucos passos dele, iluminando o que parecia ser um pátio de pedra, repleto de ossos, alguns recentes vestiam se como os guaranis em seus rituais.
O ar fedia a morte, as paredes eram negras e viscosas, repletas de sangue seco. Ele sentia uma presença próximo a ele, tentou se levantar, mas percebeu que tinha torcido o pé.
Tentou gritar por socorro, mas só então se lembrou que não viria ninguém para busca – lo, sua mente pensou por vários minutos em maneiras para conseguir sair dali, até que resolveu ir se arrastando apoiado sob os joelhos até mais adiante.
O barulho dos ossos quebrando, junto aos gemidos dele formavam um som assustador, ele ofegou depois de alguns metros, quando resolveu descansar, olhou para cima e percebeu que a parede acima dele se movia vagarosamente para baixo.
Voltou a engatinhar rumo a uma porta que o salvaria de ser esmagado. Tinha deixado o lampião para trás e estava totalmente no escuro. Tateando o chão, ele conseguiu avançar mais um pouco, até sentir uma presença ao seu redor. Gritou procurando saber quem estava ali e só ouviu o barulho dos morcegos ao longe.
O pulmão doía, o pé latejava, as pernas e os braços estavam cortados, seu coração batia rápido e o medo começava a preencher cada espaço da sua mente.
Quando começou a escutar um som que lembrava tambores e o que pareciam ser cantos em sons que a laringe humana não era capaz de compreender.
Pensou estar alucinando e que sua mente cedia a excentricidade do local, mas então se lembrou do corpo encontrado ainda recente no espaço anterior que tinha aparência guarani e pensou que eles estariam na próxima sala, fazendo algum ritual.
Talvez o matassem por profanar alguma cerimônia sagrada deles, mas a sua esperança na espécie humana era maior que o medo e ele avançou seguindo o som, até se deparar com um portal de mármore, que pela brancura em meio aquelas trevas conseguia se destacar mesmo na ausência total de luz.
Suas forças estavam se acabando, ele tentou gritar, mas somente fez com que o ar gelasse ainda mais, respirava ofegante pela boca, quando o barulho de sons cessaram e ele passou a escutar água.
Se colocou de pé, mesmo sentindo muita dor e começou a caminhar cambaleante rumo a água. Andou por corredores, passou por monumentos esculpidos na rocha até chegar a um rio que corria subterrâneo.
As águas corriam ali rumo a saída ele pensou, se abaixou e quando pôs as mãos na boca para matar a sede, sentiu que água se tornava viscosa, uma lama enegrecida que escorreu por sua mão e depois foi avançando por todo o seu corpo.
Ramon saiu dali correndo, foi encontrado quatro dias depois em estado deplorável, gritava e se contorcia como louco pela equipe do exército mobilizada para resgata – lo.
Levado a um hospital psiquiátrico, ele falava de monstros, de sombras e de monstros tão impossíveis que os médicos acreditavam que tivesse surtado.

Raras vezes voltava a sanidade e nesses momentos gostava de conversar, e eu como estagiário do manicômio Santa Edwirges ouvia o com prazer, apenas para me entristecer toda vez quando após falar do rio, ele entrava novamente em surto psicótico e começava a surtar e gritar, sendo necessário ser contido e sedado para acalma – lo.

Besouro no chão



Aquele era um caso estranho, um corpo foi encontrado no meio de um prédio abandonado, os peritos chegaram e nada foi encontrado, nem mesmo um vestígio, uma pegada, uma simples digital.
O corpo não disse muito também, não tinha marcas, ferimentos nem mesmo havia drogas nas veias. Nada foi encontrado nos bolsos, a roupa estava intacta. Era como se ela fosse uma boneca de cera, branca, com cabelos sujos, vestida com uma túnica branca quase transparente, mostrando a forma do corpo torneado e forte da policial.
Parecia que ela tinha sido colocada ali, o prédio estava abandonado e repleto de sujeira, os mendigos que ali habitavam esporadicamente não disseram nada. No entanto nenhum deles podia ser acusado de nada e logo foram liberados para voltar as suas vidas miseráveis.
O único detalhe que a perícia achou foi uma pequena mosca de ouro, que estava presa por um alfinete no vão do elevador desativado.
A identificação da moça, mostrou que ela era parte das forças de segurança do primeiro Ministro Israelense, uma soldado treinada e que estava no Brasil como parte da comitiva que veio para protege – lo durante as olimpíadas e que desapareceu dois dias antes do fim dos jogos enquanto estava em um treinamento junto as tropas de segurança do Brasil.
Várias pessoas foram chamadas para depor, seus testemunhos eram desencontrados e não trouxeram grandes progressos, o único ponto em comum era que todos se lembravam de ter deixado a em frente ao hotel em que estavam hospedadas as forças de segurança de Israel.
Os funcionários falaram pouco acerca da chegada da policial, nas câmeras ficou provado que ela realmente entrou no horário que os policiais tinham relatado.
Um detalhe no entanto chamou a atenção do investigador Cléber, responsável pelo caso, as câmeras mostravam ela entrando, no entanto a porta do quarto dela, que se abria somente com um cartão de acesso ainda estava trancada.
Os funcionários abriram a porta com uma chave extra e ali dentro tudo estava revirado, manchas de sangue estavam por todos os lados e uma mensagem escrita num espelho do banheiro mostrava um símbolo antigo.
O investigador saiu do hotel e chegou em sua casa, logo começou a procurar na internet dados a respeito e só achou em um site de teoria da conspiração sobre uma antiga seita: Os adoradores do escaravelho, uma seita muito antiga que tinha várias ramificações ao longo do Oriente médio, recentemente um de seus locais de culto foi estourado em Israel após a morte de um garoto sequestrado e aniquilado em um ritual místico, a policial responsável era justamente a que foi morta no Rio de Janeiro, que havia levado a prisão um poderoso político do país, envolvido com o grupo e com o assassinato.
O simbolo da seita era igual ao encontrado no vão do elevador, Um símbolo que parecia levar ao assassino.





O corpo sumiu.

Logo pela manhã, o investigador recebeu uma ligação da central, o corpo da policial tinha sido roubado do IML, cinco peritos e um segurança foram encontrados mortos, o centro de necropsia tinha sido atacado a noite por homens fortemente armados.
_Tudo agora se complica, ele pensou após receber as informações da central.
_ Agora não tenho mais corpo, só esse broche e nada mais.
Saiu pela porta de sua casa, e quando começou a dirigir percebeu que estava sendo seguido, acelerou em meio a trânsito do Rio de Janeiro e se evadiu dos seus perseguidores retornando no meio de um túnel em alta velocidade.
Os seus perseguidores logo estariam novamente no seu rastro, abandonou o carro assim que chegou num ponto de ônibus, levou somente uma pequena pochete onde tinha os documentos do carro e o broche, sua arma e a carteira com documentos e dinheiro.
_ Se conseguiram entrar até no IML, que é perto da central, eu iria ser um alvo rápido, seria apenas mais um policial morto serviria apenas para divertir diálogos de esquerdistas maldosos.
A rota do ônibus seguiu, e antes que chegasse na última estação, uma mulher fez sinal e o motorista parou.
Ela deu alguns passos e atirou na cabeça do motorista, no mesmo instante, apertou um botão que estava em uma das mãos e o veículo foi pelos ares no mesmo instante.
Cléber e os demais passageiros acabaram incinerados. As investigações, vasculharam em meio dos escombros e encontraram dentro de um pedaço da pochete, o estranho broche, mas não tiveram a perspicácia de procurar na internet a procura dos dados sobre a origem do objeto.
A seita tinha recrutado anos atrás a jovem que tinha cometido aquele atentado em um sanatório e a guardavam sendo drogada em um quarto fechado, esperando para usa – la a fim de resolver algum problema.
O grão mestre olhou o caso nos jornais e deu um riso, resolveu todo o problema que os assassinos da ordem tinham causado por vingança.
Logo tudo aquilo estaria esquecido e os mortos seriam apenas um número na estatística e um discurso na boca dos hipócritas.
Outra pessoa pegou o jornal de uma lixeira e viu a notícia da morte do policial, olhou para o céu e declamou em alta voz:
_ Deus, poderoso pai do universo, leve para seu seio todos os idealistas, todos os tolos que buscam melhorar o mundo, eles são nobres demais para essa existência medíocre.
A cena poética daquele homem maltrapilho, chamou a atenção de alguns que passavam pela movimentada avenida. Mas logo a rotina os consumiu e eles voltaram a ser cegos a realidade dos desfavorecidos.
Enquanto isso aquele homem, caminhava alheio ao tempo e as pessoas, vagava meditando sobre a vida, apreciando a paisagem, pulava longas alturas e já tinha ajudado muitas senhoras assaltadas por bandidos.

A sabedoria e a paz que ele transmitia eram paradoxalmente opostas a sua própria condição maltrapilha, mas somente aqueles que viram a verdade podem se permitir não ser presos pela imagem dos outros.

Três pedidos.



Sebastião era um garoto solitário. Vivia numa opulenta biblioteca que seu pai tinha. Sua saúde era precária, tinha contraído Tuberculose numa viagem que fizera as Índias com o pai, o navegador Bartolomeu da Gama.
Tinha ficado em Lisboa enquanto o pai partiu novamente rumo as Índias, financiada por mercadores ávidos por especiarias orientais.
O menino passava o dia imaginando histórias, lia com avidez contos fantásticos de cavalaria, com guerreiros ferozes que tinham os instintos altamente treinados ao ponto de farejar inimigos, ver longas distâncias e ouvir uma flecha sendo disparada.
Era fascinado pelas noveletas de cavalaria e o criado da família ia sempre ao mercado de livros em busca dessas obras.
Lisboa não vivia bons tempos, a fome havia transformado muitos homens em salteadores e numa dessas idas ao mercado, o empregado acabou sendo assaltado, correu atrás do ladrão e conseguiu alcança – lo, no entanto não recuperou o livro de seu senhor, apenas conseguiu tirar do bandido uma sacola, onde viu uma lâmpada, um item dos mouros, amaldiçoado pela igreja.
Temeu dar aquilo ao garoto, mas quando chegou e viu o olhar bravo daquele menino mimado temeu pelo seu emprego. Era mordomo da família há anos e não sabia se conseguiria outro emprego como aquele em tempos de crise.
Entregou o objeto ao garoto orando para São Sebastião de quem era devoto para não o mandar embora. O fascínio nos olhos do garoto era visível, logo ele saiu dali e correu para o quarto.
Pegou o livro Orlando Furioso e folheou as páginas até achar uma que tinha uma gravura de uma lâmpada mágica.
Viu num canto do livro que “ a lâmpada realiza todos os desejos, basta esfrega – la.”
O menino começou a esfregar a lâmpada, e está começou a sair uma fumaça mágica.
A fumaça ia aumentando na medida que ele friccionava o objeto, até que o gênio saiu do objeto e lhe deu direito a três desejos.
O menino ouviu a fala do gênio em sua mente, a criatura de corpo azulado e sem feições parecia se com uma fumaça de incenso que ardia nas igrejas, só que em proporções que lembravam um corpo humano.
O garoto nem pensou duas vezes, desejou que todos os cidadãos de Lisboa fossem como os heróis de cavalaria, com visão, audição e olfato perfeitos.
O gênio respondeu em sua mente: Está feito. O segundo pedido ele gastou pedindo a volta da sua saúde.
No mesmo instante estava recuperado totalmente. O terceiro pedido foi para ir até onde o pai estava naquele momento.
E assim o garoto foi transportado até a nau, onde seu pai se agarrava ao timão para tirar o navio de uma tempestade no cabo das tormentas, quando num dado momento viu num vislumbre seu filho cair ao mar, mas nem deu importância pensando se tratar apenas de uma vertigem passageira.
O garoto morreu naquele mesmo ano, um dia se passou em Lisboa e todos tinham ficado felizes com a execução do mordomo da família Gama, acusado de bruxaria e queimado vivo pela inquisição.
No outro dia todos acordaram e quando o sol lhes tocou os olhos ficaram cegos, sua retina queimou com a luz do sol.
O piar dos pássaros parecia com um grito de uma tropa em combate, o cheiro amplificado dos esgotos nas ruas nauseou a todos e muitos morreram vomitando até as tripas, loucos pelas novas sensações que suas mentes não estavam preparadas.
O rei a família real por sorte estavam fora, juntamente com todo seu séquito. Nenhum dos cronistas da corte presenciou a loucura que se abateu sobre a cidade.
Um dos homens da guarda, enlouquecido pelo barulho incessante em sua cabeça botou fogo no arsenal e as chamas se espalharam por toda a cidade, incendiando milhares de pessoas e destruindo as construções por onde passava.
Quando um mensageiro num forte próximo a cidade viu aquilo avisou a família real. Os padres da Inquisição que ficavam em Coimbra também foram avisados. Todos ficaram apavorados com os relatos desencontrados dos sobreviventes que pareciam acometidos de uma insanidade total e completa.
O caso foi julgado por um tribunal da inquisição e todos os que escaparam da tragédia foram mortos e enterrados em catacumbas abaixo da igreja dos Anjos.
Nenhum cronista foi autorizado a publicar sobre os eventos ocorridos naquele primeiro de novembro do ano de 1755 e a história foi reescrita. Disseram que um terremoto tinha causado um incêndio e matado a todas as pessoas, mesmo aos que sobreviveram ao fogo.
A população não ousou questionar e o rei temendo que o medo fizesse as pessoas evitar a cidade de Lisboa, ordenou que sob pena de lei que ninguém jamais deveria falar daquele dia onde o demônio agiu na capital do império Português.

O pai de Sebastião morreu de cólera na costa Africana, seus barcos se amotinaram, jogaram o segundo – oficial no mar e resolveram seguir ao costume francês e se tornarem saqueadores.

Sons da noite

Caminhar a noite é uma experiência que sempre fascina. Os sons a noite são mais aguçados. É como se a ausência de luz tornasse tudo mais son...