Sebastião era um garoto
solitário. Vivia numa opulenta biblioteca que seu pai tinha. Sua
saúde era precária, tinha contraído Tuberculose numa viagem que
fizera as Índias com o pai, o navegador Bartolomeu da Gama.
Tinha ficado em Lisboa enquanto o
pai partiu novamente rumo as Índias, financiada por mercadores
ávidos por especiarias orientais.
O menino passava o dia imaginando
histórias, lia com avidez contos fantásticos de cavalaria, com
guerreiros ferozes que tinham os instintos altamente treinados ao
ponto de farejar inimigos, ver longas distâncias e ouvir uma flecha
sendo disparada.
Era fascinado pelas noveletas de
cavalaria e o criado da família ia sempre ao mercado de livros em
busca dessas obras.
Lisboa não vivia bons tempos, a
fome havia transformado muitos homens em salteadores e numa dessas
idas ao mercado, o empregado acabou sendo assaltado, correu atrás do
ladrão e conseguiu alcança – lo, no entanto não recuperou o
livro de seu senhor, apenas conseguiu tirar do bandido uma sacola,
onde viu uma lâmpada, um item dos mouros, amaldiçoado pela igreja.
Temeu dar aquilo ao garoto, mas
quando chegou e viu o olhar bravo daquele menino mimado temeu pelo
seu emprego. Era mordomo da família há anos e não sabia se
conseguiria outro emprego como aquele em tempos de crise.
Entregou o objeto ao garoto
orando para São Sebastião de quem era devoto para não o mandar
embora. O fascínio nos olhos do garoto era visível, logo ele saiu
dali e correu para o quarto.
Pegou o livro Orlando Furioso e
folheou as páginas até achar uma que tinha uma gravura de uma
lâmpada mágica.
Viu num canto do livro que “ a
lâmpada realiza todos os desejos, basta esfrega – la.”
O menino começou a esfregar a
lâmpada, e está começou a sair uma fumaça mágica.
A fumaça ia aumentando na medida
que ele friccionava o objeto, até que o gênio saiu do objeto e lhe
deu direito a três desejos.
O menino ouviu a fala do gênio
em sua mente, a criatura de corpo azulado e sem feições parecia se
com uma fumaça de incenso que ardia nas igrejas, só que em
proporções que lembravam um corpo humano.
O garoto nem pensou duas vezes,
desejou que todos os cidadãos de Lisboa fossem como os heróis de
cavalaria, com visão, audição e olfato perfeitos.
O gênio respondeu em sua mente:
Está feito. O segundo pedido ele gastou pedindo a volta da sua
saúde.
No mesmo instante estava
recuperado totalmente. O terceiro pedido foi para ir até onde o pai
estava naquele momento.
E assim o garoto foi transportado
até a nau, onde seu pai se agarrava ao timão para tirar o navio de
uma tempestade no cabo das tormentas, quando num dado momento viu num
vislumbre seu filho cair ao mar, mas nem deu importância pensando se
tratar apenas de uma vertigem passageira.
O garoto morreu naquele mesmo
ano, um dia se passou em Lisboa e todos tinham ficado felizes com a
execução do mordomo da família Gama, acusado de bruxaria e
queimado vivo pela inquisição.
No outro dia todos acordaram e
quando o sol lhes tocou os olhos ficaram cegos, sua retina queimou
com a luz do sol.
O piar dos pássaros parecia com
um grito de uma tropa em combate, o cheiro amplificado dos esgotos
nas ruas nauseou a todos e muitos morreram vomitando até as tripas,
loucos pelas novas sensações que suas mentes não estavam
preparadas.
O rei a família real por sorte
estavam fora, juntamente com todo seu séquito. Nenhum dos cronistas
da corte presenciou a loucura que se abateu sobre a cidade.
Um dos homens da guarda,
enlouquecido pelo barulho incessante em sua cabeça botou fogo no
arsenal e as chamas se espalharam por toda a cidade, incendiando
milhares de pessoas e destruindo as construções por onde passava.
Quando um mensageiro num forte
próximo a cidade viu aquilo avisou a família real. Os padres da
Inquisição que ficavam em Coimbra também foram avisados. Todos
ficaram apavorados com os relatos desencontrados dos sobreviventes
que pareciam acometidos de uma insanidade total e completa.
O caso foi julgado por um
tribunal da inquisição e todos os que escaparam da tragédia foram
mortos e enterrados em catacumbas abaixo da igreja dos Anjos.
Nenhum cronista foi autorizado a
publicar sobre os eventos ocorridos naquele primeiro de novembro do
ano de 1755 e a história foi reescrita. Disseram que um terremoto
tinha causado um incêndio e matado a todas as pessoas, mesmo aos que
sobreviveram ao fogo.
A população não ousou
questionar e o rei temendo que o medo fizesse as pessoas evitar a
cidade de Lisboa, ordenou que sob pena de lei que ninguém jamais
deveria falar daquele dia onde o demônio agiu na capital do império
Português.
O pai de Sebastião morreu de
cólera na costa Africana, seus barcos se amotinaram, jogaram o
segundo – oficial no mar e resolveram seguir ao costume francês e
se tornarem saqueadores.
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